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50 anos do Golpe de 64

01/04/2014 - Atualizado em 01/04/2014 13h53

DA REDAÇÃO (MG) - Cinquenta anos depois do golpe de 1964, ainda há quem festeje a ação dos “bravos militares” que, sob o pretexto “de nos proteger dos inimigos” e do comunismo, instaurou no Brasil anos de medo e silêncio. Embora o próprio Estado já tenha reconhecido que cometeu crimes de lesa-humanidade ao longo do regime militar, ainda há partidários do golpe, que o chamam de “Revolução de 64”.

Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), deputado Durval Ângelo (PT), a postura daqueles que ainda defendem o golpe militar é uma tentativa de negar o passado, de encobrir os próprios erros. “Um regime que depõe um presidente legitimamente eleito, que exclui o voto direto, que tortura milhares de pessoas, que assassina ou desaparece com mais de 500, que cassa centenas de mandatos políticos, que joga na ilegalidade partidos políticos e sindicatos, que silencia a imprensa, não é ditadura?”. A pergunta retórica pontua o posicionamento enfático do parlamentar. “Parte da nossa história não pode virar poeira. Precisamos lembrá-la até mesmo para não repeti-la”, defende.

O presidente da ALMG, deputado Dinis Pinheiro (PP), também defende a necessidade de se fazer esse resgate histórico. “Relembrar os 50 anos do golpe de 1964 é essencial para retirarmos, do episódio e de seus desdobramentos, lições que possam orientar o nosso comportamento atual, evitando a repetição de erros. O debate, todavia, não deve ser feito apenas de olho no retrovisor, buscando a revisão do passado, mas de modo a direcionar as ações do futuro”, destaca.

Para reconstruir a história do regime militar no Brasil, é preciso compreender um contexto mais amplo, em que duas nações - os Estados Unidos e a antiga União Soviética - polarizaram o cenário político no período pós-Segunda Guerra Mundial, a partir de 1945, até início da década de 1990: foi a chamada guerra fria.

“Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares que os protegeram de seus inimigos”. Esta foi a manchete do jornal O Globo de 2 de abril de 1964, dia seguinte à deposição do presidente João Goulart (PTB), o Jango. Ele havia assumido a Presidência da República depois que Jânio Quadros (PDC) renunciou ao cargo em 25 de agosto de 1961. Ambos foram eleitos democraticamente em 1960. Pertenciam, na verdade, a legendas adversárias, mas, nesse período, as candidaturas para presidente e vice eram desvinculadas. Conformaram-se, assim, as circunstâncias políticas que levaram à ditadura.
Nesse contexto de guerra fria, Estados Unidos e União Soviética passaram a fomentar disputas ideológicas que evitaram uma guerra nuclear, mas que propiciaram o surgimento de regimes autoritários, sobretudo nos países latino-americanos. O confronto entre o capitalismo e o comunismo chegou assim a terras brasileiras.

“A ditadura militar brasileira não foi um fato isolado na história da América Latina. Na mesma época, regimes semelhantes nasceram de rupturas na ordem constitucional de outros países no subcontinente, tendo as Forças Armadas assumido o poder em consonância com a lógica da guerra fria”, diz o livro Direito à Memória e à Verdade, publicado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.

Ameaça vermelha só para brasileiro ver

A contabilidade do regime militar não fecha se não for incluída nessa dívida com o País, sobretudo com a geração que vivenciou as suas consequências diretas, a responsabilidade civil. De acordo com a cientista política Vânia Bambirra, civis também participaram da arquitetura do golpe. Parte do empresariado brasileiro, insatisfeito com a atuação de Jango junto a sindicatos e demais entidades de classe, dentre outras ações, financiou a operação que depôs o então presidente, segundo ela.

Para a cientista política, talvez o maior engodo da história desse período tenha sido o alarde sobre a “onda vermelha”, ameaça comunista que estaria avançando em direção à América Latina. Segundo a pesquisadora, não havia condições estruturais ou políticas de se instalar no Brasil um regime comunista ou socialista. Vânia Bambirra reconhece que algumas lideranças de esquerda participavam do governo janguista, mas esse fato não justifica a ideia de que o País passaria a um modelo de economia estatal.

Ela explica que houve, simultaneamente, na década de 1960, não só em território brasileiro como nos demais países latino-americanos, significativa ascensão de movimentos populares, o que, somado à disposição de João Goulart em promover as chamadas reformas de base (agrária, eleitoral e tributária), motivou a reação desproporcional das elites e dos militares, a quem não interessavam modificações nas regras do jogo e a perda de poder.

O deputado Durval Ângelo também acredita que o comunismo foi apenas um pretexto para se interromper o que ele considera um grande processo de mudanças, de desenvolvimento autônomo, de crescente conscientização e politização do cidadão. "Essa dívida da elite empresarial da época e dos militares brasileiros é impagável”, enfatiza o parlamentar.

Os documentos do Departamento de Ordem Política e Social em Minas Gerais (Dops-MG), já disponíveis no site do Arquivo Público Mineiro, demonstram que o comunismo exigiu grande esforço do aparato de repressão. Os simpatizantes dessa vertente ideológica foram objeto de investigação desde 1929. Esse foi o grande eixo da atividade da polícia política entre 1964 e 1968, destacando-se os temas relacionados ao Partido Comunista.

Ao longo das duas décadas do regime militar, houve 10 mil exilados, 130 banidos do País, 4.862 pessoas com direitos políticos cassados, além de mortos, torturados, desaparecidos e 50 mil pessoas detidas apenas nos primeiros meses da ditadura.

Assessoria da ALMG

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