MANHUAÇU (MG) - Após quase um ano do primeiro caso do novo Coronavírus – COVID-19 – no Brasil, o Presidente da República sancionou as Leis nº. 14.124 e 14.125/2020, as quais, conjuntamente, tratam do estabelecimento do regime jurídico relacionado à aquisição de vacinas e insumos contra a pandemia.
Diante desse cenário, o Portal Caparaó entrevistou o advogado Layon Nícolas Dias Pereira, especialista em Direito Público; ex-Secretário da Comissão de Direito Público da 54ª Subseção da Seção do Estado de Minas Gerais da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Minas Gerais; ex-Membro da Comissão de Direito Público da Seção do Estado de Minas Gerais da Ordem dos Advogados do Brasil, com notória especialização no campo do Direito Público Municipal, sobre de quem é a responsabilidade de realizar as aquisições e a distribuição de doses para a vacinação contra a covid-19.
Doutor, sendo direto: de quem é a obrigação de realizar as aquisições e a distribuição de doses para a vacinação contra a COVID-19?
Esta obrigação é muito clara na Lei nº. 14.124/2021, é da União, ou seja, é do Governo Federal, a responsabilidade por realizar as aquisições e a distribuição tempestiva de doses suficientes para a vacinação dos grupos previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19.
A Lei nº. 14.124/2021 permite que os Municípios comprem as vacinas?
Segundo a Lei nº. 14.124/2021, sim, mas de forma excepcional, pois os Municípios, assim como os Estados, são autorizados a adquirir, a distribuir e a aplicar as vacinas contra a COVID-19, caso a União/Governo Federal não realize as aquisições e a distribuição tempestiva de doses suficientes para a vacinação dos grupos previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19.
Mas, recentemente o STF decidiu que os Municípios poderiam comprar vacinas, como ficou esta questão?
Sim, o STF, na ADPF nº. 770, autorizou que os Estados e Municípios adquiram e distribuam vacinas contra a COVID-19, mas apenas no caso de descumprimento do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, como já adiantado, ou, na hipótese de que este não forneça cobertura imunológica tempestiva e suficiente contra a doença.
Então hoje qual é o papel dos Municípios na vacinação contra a COVID-19?
Basicamente auxiliar na execução do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, recebendo e aplicando as vacinas adquiridas pelo Governo Federal.
Estamos vendo uma certa demora na vacinação da população, isto seria suficiente para que os Municípios possam adquirir as vacinas?
Ao meu ver até então não, pois o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19 aparentemente está sendo cumprido, sendo certo que o atraso é até normal sob o ponto de vista da escassez dos próprios imunizantes e da grandeza territorial do Brasil, e etc.
Se o Município vier a comprar as vacinas poderá vacinar exclusivamente a sua população?
Esta é uma questão um tanto quanto complexa e de grandes discussões, principalmente no campo jurídico e político, mas ao meu ver não, pois a aplicação das vacinas contra o COVID-19 deverá observar o previsto no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, ou naquele que vier a substituí-lo.
Mas, e quando finalizar a vacinação dos grupos prioritários, o Município poderá adquirir vacinas e aplicá-las ao restante da população local?
No meu entendimento, com a legislação que está aí também não, pois enquanto existir Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, ou naquele que vier a substituí-lo, a Administração Pública deve segui-lo.
É possível uma empresa privada de Manhuaçu, por exemplo, comprar as vacinas e doar para o Município aplicar na sua população?
Primeiramente é importante dizer que as pessoas jurídicas de direito privado, ou seja, empresas, associações, e etc. podem adquirir vacinas contra a COVID-19, porém, devem doar toda a aquisição ao Sistema Único do Saúde – SUS –, a fim de serem utilizadas no âmbito do Programa Nacional de Imunizantes.
Na sua visão qual a principal razão para não autorizarem as empresas comercializarem as vacinas para quem quiser comprar e se vacinar?
Sem dúvida a escassez dos próprios imunizantes, uma vez que a crise sanitária agrava todo o mundo, sendo o Brasil hoje o epicentro da pandemia.
Após o término da imunização dos grupos prioritários previstos Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, as pessoas jurídicas poderão adquirir, distribuir e administrar vacinas?
Sim, desde que atendidos os requisitos legais e sanitários, bem como que pelo menos 50% (cinquenta por cento) das doses sejam, obrigatoriamente, doadas ao SUS e as demais sejam utilizadas de forma gratuita.
Acaso surja a necessidade de os Municípios virem a ter que adquirir as vacinas, o que o senhor, enquanto especialista em Direito Público, vê como alternativa, considerando a complexidade do tema?
Para os Municípios de grande porte entendo que as compras das vacinas poderão ser concretizadas de forma até tranquila. No entanto, para os Municípios de médio e pequeno porte, entendo, a princípio, que a melhor alternativa seria se consorciarem.
Já existe algum movimento dos Municípios nesse sentido de criação de consórcio?
Sim, a Frente Nacional de Prefeitos criou no dia 22 de março de 2021 um consórcio nacional para aquisição de vacinas contra a COVID-19. O consórcio está denominado de CONECTAR. Inclusive, Municípios da nossa região já fazem parte.
Como o senhor vê esta política pública de vacinação centralizada no Governo Federal?
Como municipalista, sabedor de que a população espera respostas em primeiro lugar do Poder Executivo Municipal, por ser este o Poder Público que está mais próximo dos cidadãos, vejo que este deveriam ter mais autonomia, inclusive possibilitando, de imediato, comprar vacinas. No entanto, reconheço a excepcionalidade da situação e de que o Governo Federal, em tese, tem mais condições técnicas, apesar da grande demora em adotar políticas públicas efetivas para o enfrentamento da pandemia, para a consecução da compra das vacinas.
Como cidadão, o senhor vê que o Brasil está no caminho certo para combater a pandemia?
O povo brasileiro clama por saúde, por vacina, por economia e por emprego, mas o atual cenário político-jurídico-social não demonstrada união de esforços para a resolução desses problemas. Entendo que sem as vias do diálogo e da observância a Constituição não vamos resolvê-los.
Redação do Portal Caparaó